Minas Gerais: Revisão na lei de incentivo

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MINISTÉRIO DA CULTURA | LEI ROAUNET

Revisão na lei de incentivo
Política cultural.Alterações na Lei Estadual de Incentivo à Cultura dividem opiniões e reaquecem debate sobre o fomento à área

CARLOS ANDREI SIQUARA

Criada em 1998, a Lei Estadual de Incentivo à Cultura completa 15 anos neste 2013. Como se trata de um dos principais mecanismos de financiamento de projetos culturais em Minas Gerais, seu funcionamento é motivo de atenção contínua da classe artística, que, por sua vez, constantemente relata morosidades para tornar viáveis algumas iniciativas por meio desse instrumento. A dificuldade, no entanto, não é exclusiva desse dispositivo e abarca também outras esferas, desde a municipal até a federal, como a Lei Rouanet.

Em vista, porém, do trâmite do projeto de lei (PL) de número 3626/12, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o qual visa alterar, durante o prazo de dez anos, o percentual da contrapartida requerida das empresas que almejam debitar, dos impostos devidos ao governo estadual, valores investidos em projetos culturais contemplados pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura, a discussão em torno daqueles empecilhos volta à ordem do dia.

Não é de hoje, por exemplo, que artistas e produtores culturais se deparam com a incerteza em torno da captação de recursos, após ter um projeto aprovado nesses programas. E mesmo aqueles que conseguem se concentram, geralmente, em regiões centrais do Estado, o que deixa os proponentes do interior em segundo plano. De acordo com o governo estadual esta foi uma das motivações para a criação do projeto de lei, cujo objetivo principal é estimular a participação de pequenas e médias empresas nesse processo.

A medida intenta alcançar essa meta ao reduzir o percentual da contrapartida – verba a ser repassada diretamente do empreendedor aos responsáveis pelo projeto cultural aprovado -, de 20% a 5%, 3% e 1%, para grandes, médias e pequenas empresas respectivamente.

Levado a debate público em audiência realizada na manhã da última quarta-feira, solicitada pelos deputados Arlen Santiago (PTB), Elismar Prado (PT) e Luzia Ferreira (PPS), o PL provocou reações simpáticas e contrárias ao que propõe.

Rômulo Duque, presidente do Sindicato dos Produtores de Artes Cênicas (Sinparc), se posicionou favorável a tal medida. “A redução da contrapartida vai expandir o número de projetos patrocinados. Isso é um fato. Isso não é um desejo”, disse durante o encontro. Por outro lado, Rubem dos Reis, representante das Associação dos Produtores Culturais de Uberlândia e região, questionou a aposta no fomento à atividade artística apenas através dessa mudança na Lei Estadual de Incentivo à Cultura.

Para Rubem, assim como afirmou Helder Quiroga, secretário-executivo do Fórum Mineiro do Audiovisual, é importante fortalecer o Fundo Estadual de Cultura. “Sem o fundo, nada do que nós estamos comentando aqui vai surtir efeito. Não há condição do Estado de Minas Gerais continuar com o Fundo Estadual de Cultura da maneira como ele está. Sem dinheiro, fica praticamente um jogo de política de balcão”, argumentou Rubem.

Em relação à ideia de que a diminuição da contrapartida poderia estimular as empresas a investirem mais em projetos espalhados pelo o interior, ele resumiu sua opinião a uma frase: “Isso para nós representa apenas uma esperança”. E indagou na sequência: “De alguma forma ela garante concretamente que esse recurso vai chegar ao interior?”.

Já Guilardo Veloso, representante do Instituto Sociocultural do Jequitinhonha – Vale Mais avançou na temática em foco e questionou, entre outros aspectos, a própria trajetória das leis de incentivo. “Quando criadas, essas leis vieram sob o argumento de que em algum momento o empresariado nacional iria se sensibilizar tanto que nós não precisaríamos mais desse instrumento. Ao contrário disso, hoje a gente se encontra em uma situação em que quem define a política cultural é a iniciativa privada. Quase todos os projetos são aprovados via lei, mas somente cerca de 13% conseguem captar”, disse.

A partir dessas manifestações, o deputado Elismar Prado disse que um relatório será anexado ao projeto de lei que, após ser aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça, será encaminhado à Comissão de Fiscalização Financeira. “Estamos estudando algumas formas de abarcar as sugestões que nos foram apresentadas durante a audiência. Uma delas é criar algum mecanismo na legislação que garanta uma maior participação do interior nas leis de incentivo”, observa o deputado.

Ainda de acordo com ele, a ideia é que o projeto não demore muito nessas etapas até chegar a uma decisão final.

“Pretendemos aprovar o PL na comissão de cultura rapidamente. A ideia é que ele chegue a plenário o quanto antes. Lá, para ele ser efetivado, precisará ser aprovado em dois turnos. É importante resolvermos isso logo porque muitos produtores estão esperando tanto a aprovação ou não do projeto para poderem programar as suas atividades ao longo do ano”, conclui Prado.

CONTINUAÇÃO DA CAPA
Artistas discutem alternativas às leis de incentivo
Carlos Andrei Siquara
Durante a audiência pública promovida para se discutir o projeto de lei 3626/12 que visa alterar a Lei Estadual de Incentivo à Cultura, reduzindo o valor de contrapartida das empresas interessadas em patrocinar projetos culturais aprovados por meio desse mecanismo, estavam presentes convidados como o músico e compositor, Makely Ka, representante do setor da música no Conselho Estadual dePolítica Cultural de Minas Gerais, além de Antônio Carlos Carluty Ferreira, diretor-presidente da Associação Movimento Teatro de Grupo de Minas Gerais, dentre outros.

Makely, ao defender a necessidade de se discutir com cautela aspectos do projeto antes que ele fosse aprovado, acabou mirando o cenário da política cultural como um todo e alertou sobre a deficiência de um sistema “ultrapassado”. “A revisão das alíquotas de contrapartida ou outras formas de alteração na Lei Estadual de Incentivo à Cultura não são suficientes. A recomendação do Sistema Nacional de Cultura é o fortalecimento dos fundos estaduais. Somente o fundo é capaz de determinar uma política de Estado eficiente. Nós não podemos ficar reféns dos instrumentos providos pelas leis de incentivo. Precisamos, sim, ter disponíveis mais prêmios, bolsas e programas”, opina Makely Ka.

Ainda de acordo com o músico, um ponto importante a se considerar é que, dentro do limite do teto de valores de renúncia fiscal permitido para se contemplar um número equivalente de projetos culturais, atualmente em média R$ 55 milhões, vem sendo anualmente atingido. “Ou seja, em 2011, por exemplo, todos os recursos permitidos pela lei foram captados. Portanto, reduzir a alíquota da contrapartida não faz muito sentido”, observa Makely.

Mediação. Embora outros defenderam a urgência da aprovação da medida, tendo em vista a necessidade de colocar em prática o cronograma anual, houve quem tentou colocar também em pauta uma tentativa de se pensar num ponto de equilíbrio. Maria Magdalena Rodrigues da Silva, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de Minas Gerais (Sated-MG) observou que os profissionais da área da cultural atualmente estão de certa maneira perdidos, “sem horizontes” face à realidade atual.

As leis de incentivo à cultura, na visão dela, trouxeram alguns progressos por um lado, mas por outro têm amarrado os artistas de maneira que eles não estão conseguindo visualizar muitas oportunidades.

“Foi-se o tempo em que a gente passava na rua, via uma empresa e falava assim: vou entrar nessa aqui. E ali conseguíamos o nosso patrocínio. Temos que entender, em meio a todos esses progressos, quando foi que gente se perdeu. Quando foi que a gente ficou refém de uma lei que não deixa mais a gente ter personalidade artística, trabalhando com o que a gente escolheu para viver. Se alguns acham um absurdo a redução da alíquota de 20%, nós concordamos. Por outro lado, a situação está indo mal e o interior pior, então nós precisamos encontrar um caminho do meio”, diz.


Publicado por Ana Paula Sena de Almeida

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